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Edilson Pereira - Escritor e Dramaturgo
Crônicas

“Eu não vi Viviane Malone”

ekaterina-klimova1

Deixei o litoral numa quinta-feira depois do almoço. Foram oitenta dias longe da capital. Seis de agosto quente e ensolarado para um inverno, com extensas camadas de nuvens, como flocos de algodão levitando no céu azul. A cachorra resfolegava no banco traseiro do carro, um Sendero branco. Latia sem parar. Parei duas vezes no caminho para ela beber água e urinar. Mas ela continuou a resfolegar e latir. Até cansar e deitar no banco traseiro. Eu voltava do litoral com saldo positivo. Mais de vinte contos na bagagem e oitenta dias de bons almoços, com peixes e vinho, e jantares frugais. E também imagens de passeios por praias desertas ao fim de cada dia. No começo, os passeios eram com máscara no rosto, ainda motivado pelo temor de ser contaminado pelo vírus. Não demorou para perceber que numa área em que não havia alma viva, lugar rústico e de pouco acesso, não fazia sentido a sugestão do protocolo. Era libertador andar sem máscara na imensidão de areia entre a restinga e o mar. Os passeios contribuíram para amenizar a angustia provocada pelos noticiários noturnos, sempre com notícias ruins.

Não aguentava mais ouvir:

“O número de mortos hoje chegou a…”

Era sempre a mesma ladainha macabra. Uma estatística interminável e crescente. A longa estadia no litoral contribuiu para eu atingir o segundo objetivo na pandemia que era não ficar louco antes de agosto, quando se acreditava que as coisas poderiam estar voltando ao normal, caso os índices de isolamento social sugeridos pela Organização Mundial de Saúde fossem respeitados. Chegar vivo à normalidade era o primeiro objetivo. Não fiquei louco até agosto, mas as coisas não voltaram ao normal. Quer dizer, houve relaxamento geral e as contaminações e as mortes aumentaram. Isto não poderia ser considerado normalidade. No entanto eu não poderia ficar longe de casa por tempo indeterminado. Por isso decidi na terça-feira à noite voltar, ainda que para ficar entocado no apartamento. Pelo menos teria a companhia dos livros. A volta ficou acertada para quinta-feira depois do almoço. Estava agora no interior do automóvel que cortava a estrada com montanhas e vegetação nas duas margens e aproveitei para fazer ligeiros balanços.

“Vi tudo o que era para ver e descansei o que era para descansar.”

Na bagagem trazia histórias que ouvi, anotei e escrevi. Era o que tinha para fazer nas horas vagas. Escrever e ler. À noite, até pedaços de velhas novelas da Globo, reprisadas por causa da pandemia, eu vi. As produções foram interrompidas. E os artistas estavam em quarentena. Nenhuma novela era com a minha amada Viviane Malone. Mas nada era perfeito. A viagem durou duas horas e meia. Ao chegar na capital me espantei com a agitação e aglomerações. Pequenos congestionamentos. Se ao sair para o litoral em maio, as ruas não estavam desertas como seria prudente, mas pelo menos com pouco movimento, ao voltar estavam cheias de gente e carros.

Murmurei como estivesse em outro planeta:

“Isto é absurdo!”

Era inevitável pensar que o vírus iria fazer festa e a pandemia não teria prazo para terminar. Como seriam os próximos meses eu não tinha a menor ideia. Ao chegar ao apartamento, depois de tirar o que havia no carro, atendi uma ligação do litoral. Era Macedônio Hernandez, o argentino dono da churrascaria a poucos metros do mar e que me emprestava o Fusca para conhecer as praias distantes e desertas de Guaratuba.

Ele perguntou como se não soubesse:

“Você foi embora mesmo?”

Eu sentei na poltrona da sala, olhei através da janela do apartamento o céu azul cheio de nuvens e disse sem entusiasmo:

“Não posso fugir do vírus até o fim de meus dias. Vi tudo o que tinha para ver. Fui onde tinha para ir. Estava na hora de voltar. Não tinha mais o que fazer aí. O lugar é agradável, bom para se escapar do vírus, mas agora estou de volta pro meu aconchego, trazendo na mala bastante saudade.”

Ele riu do outro lado.

“Pois acho que você está enganado!”

“Por quê?”

“Sabe quem esteve aqui ontem à noite jantando no restaurante com a irmã?”

Eu não tinha a menor ideia.

“Não!”

“Viviane Malone!”

Aquilo foi um choque. Ela era o meu xodó.

“Viviane Malone?”

“Exatamente.”

“O que ela estava fazendo aí?”

“Ela está em casa de parentes. A duas quadras de onde você estava. A família tem casas aqui na cidade há muitos anos.”

Mal acabara de botar os pés no apartamento e já estava perplexo, um pouco arrependido de ter voltado.

“Não acredito!”

“Ela está aqui há dois meses. E vai ficar até a pandemia acabar.”

Eu murmurei atônito:

“Viviane Malone!”

Macedônio Hernandez riu do outro lado enquanto dizia:

“Exatamente.”

“Ela perguntou de mim?”

Macedônio Hernandez soltou uma gostosa e humilhante gargalhada e disse zombeteiro:

“Ela nem sabe que você existe!”

Era verdade. Viviane Malone nem sabia da minha existência. Mas eu sabia quase tudo da existência dela. Incluindo os três casamentos.

Eu pensei:

“Como as atrizes gostam de casar!”

Eu disse com uma ponta de suspeita:

“Mas o restaurante abriu na pandemia?”

“Está tudo aberto aqui, amigo. Não tem como controlar este povo irresponsável. O prefeito desistiu.”

“Que loucura!”

“Eu adoro este país. Mas ele mais parece um hospício que outra coisa.”

Eu pensei que era verdade.

E perguntei:

“E se aparecer alguém contaminado?”

Macedônio Hernandez respondeu;

“Estou fazendo minha parte. Estacionamento exclusivo e mesas personalizadas.”

Aquilo era uma piada. Eu perguntei:

“O que são mesas personalizadas?”

“Foi um troço que eu inventei aqui. Mas existe algo parecido em Buenos Aires. Privacidade, intimismo e discrição. Gastei algum dinheiro com marceneiro e vidraceiro e valeu a pena.”

“O que você aprontou?”

“Separamos o restaurante em pequenos quiosques envidraçados. Totalmente isolados um do outro. Cada um distante do outro. Totalmente higienizados depois de usados. São dez quiosques. Quem entra não tem contato com ninguém. Não tem auto atendimento. É tudo a la carte. Só entra quem faz reserva antecipada. Cardápio escolhido com antecedência para não ter espera. Quem não segue a regra, não entra. Segurança total. Deu um charme elitista, mas funcionou. A clientela voltou. E só gente bacana.”

Por gente bacana ele queria dizer endinheirada.

Eu disse:

“Até Viviane Malone foi conferir!”

“Até Viviane Malone conferiu e gostou.”

“Puta que pariu!”

“Na crise estão as boas oportunidades.”

“E agora? O que eu faço?”

O meu amigo argentino disse:

“Acho bom você pegar a cachorra e voltar correndo. Talvez possa encontrar a sua amada no meu restaurante. Ou numa praia deserta. Numa praia deserta tudo pode acontecer. Pense nisso!”

Eu nem respondi. Era uma piada. Da qual só ele achou graça, porque estava rindo. Quando parou de rir, disse:

“Eu posso ficar alerta. Quando ela agendar para vir aqui de novo eu te aviso. O que acha?”

Achei que fosse outra piada:

“Não posso ficar mudando de planos como estas atrizes mudam de maridos.”

Era uma boa frase. Ele riu mais uma vez.

Ele disse:

“Este mundo é um pandeiro, meu amigo!”

Pensei: filme de 1947, com Oscarito e Grande Otelo.

E respondi:

“Este mundo é um hospício, amigo.”

Macedônio Hernandez disse:

“Filme de 1944, com Cary Grant, Peter Lorre e Priscilla Lane.”

Era isso. Não tínhamos mais o que falar. Macedôno Hernandez falou para eu me cuidar e desligou. Disse que se quisesse voltar ele dava um jeito. Eu não ia voltar. Não fazia sentido. Embora gostasse de Viviane Malone, ela não tinha ciência de minha existência. Assim como as quinze atrizes estrangeiras das quais eu fiz um perfil por dia para a minha página no Facebook enquanto estive no litoral. Era um passatempo e que meus amigos gostaram. Logo de cara arrumei um pequeno e bizarro problema. Me propus a fazer um perfil por dia. E limitei em quinze divinas. Na hora de escolher não sabia que critério usar. Porque as divinas me acompanharam da infância a idade madura. Achei justo ceder às pulsações emotivas e eróticas do adolescente que fui e eleger as que mais intensamente habitaram a minha imaginação até por volta de vinte e dois anos. Não sei se foi uma escolha racional ou se foi homenagem ao devoto dedicado que fui a elas.

Ali na poltrona fiquei pensando:

“Elas foram por muito tempo namoradas impossíveis, mas sempre presentes!”

Era uma forma de ver as coisas. Depois de cada sessão dominical ou no sábado à noite no Cinema Maringá, no Cine Paraná e depois no Cine Plaza muitos rapazes voltavam com as suas namoradas para casa. Eu voltava com elas. Com as divas dos filmes que acabara de ver. Voltava feliz pensando nelas. O problema era que o sujeito viciava em mulher bonita e inacessível e ficava arrogante. Ele deixava passar muitas vezes a oportunidade de entrar na realidade sexual através de uma garota da cidade, simplória e de natureza generosa. Como se sujeitar a uma simplória depois de dormir sonhando com grandes divas. Na minha lista para os perfis do Facebook estavam Greta Garbo, Marlene Dietrich, Vivien Leigh, Renate Muller, Lupe Velez, Hedy Lammar, Rita Hayworth, Ingrid Bergman, Ava Gardner, Sophia Loren, Jeanne Moreau, Marilyn Monroe, Catherine Deneuve, Julie Christie e Rachel Welch. Quinze. Ainda nesta idade provecta elas me causavam embaraços. Quando terminei de publicar o último perfil senti um profundo remorso por ignorar Lousie Brooks, Jean Harlow, Lauren Bacall, Gene Tierney, Grace Kelly, Audrey Hepburn, Maria Félix, Kim Novak, Gina Lollobrigida, Jane Fonda, Brigite Bardot, Candice Bergen, Monica Vitti, Monica Belucci e Kim Bessinger. Quinze. E seria possível fazer outra lista com mais quinze. E depois dessa, outra. Era como as tivesse traído. No começo do ano, antes da pandemia, estive no litoral e me encontrei com Macedônio Hernandez. Eu lhe falei do entusiasmo juvenil por estas mulheres e ele ficou estarrecido.

Ele perguntou:

“Mas não há nenhuma brasileira entre elas! Você não gosta das brasileiras?”

Era uma boa observação. Eu respondi:

“Claro que eu gosto. Mas evito escrever sobre elas para não arrumar confusão.”

“Como assim?”

Então lhe contei o episódio entre eu e Sônia Braga. Aconteceu no primeiro semestre de 2013. No Facebook, este terreno escorregadio e dinâmico. Um amigo fez comentário um tanto empolgado sobre a atriz que nasceu em Maringá. O comentário foi embaixo de uma foto dela na rede social. Acrescentei algumas coisas. Em menos de cinco minutos apareceu uma mensagem no in box. Fui conferir. Era Sônia Braga.

Ela perguntava:

“Por que você está falando isto de mim?”

À princípio pensei que se tratasse de perfil falso. O Facebook tem muito disso.

Eu perguntei:

“Sônia, é você?”

“Sim. Claro que sou eu.”

“Onde você está?”

“Estou em Nova York.”

“E como você sabe que eu falei o que eu falei?”

“Porque a foto embaixo da qual você fez o comentário está na minha página.”

Eu não sabia. Não tinha reparado. Pensei que fosse publicação de meu amigo. Era quase sempre assim. Eles publicavam fotos de atrizes famosas e sempre aparecia gente para fazer comentários.

Eu perguntei tratando de encurtar a conversa:

“O que você quer de mim?”

“Quero que apague o comentário. Ele é de natureza excessivamente íntima.”

Eu fui lá e apaguei o comentário. Ela agradeceu e esta foi a única vez que falei com Sônia Braga. Não foi um diálogo inesquecível, mas foi o que houve. Quando Macedônio Hernandez ouviu a história foi como lhe contasse uma grande piada. Meu amigo argentino tinha um humor original e era acostumado a achar motivo de riso em situações que eu considerava um tanto constrangedora ou desagradável.

Macedônio Hernandez perguntou, ávido de curiosidade:

“Mas o que você escreveu?”

“Nada demais. Não foi ofensivo ou obsceno. Mas foi algo que ela não gostou.”

“Mas você não se lembra?”

Eu me lembrava, claro. Eu disse:

“A minha tia foi vizinha da mãe da Sônia Braga quando ela morou em Maringá. Eu mencionei isto. Eu presumo que ela considerou a observação provinciana e não gostou.”

Macedônio Hernandez ria. Ele queria mais detalhes. Mas não havia mais detalhes. Foi apenas aquilo.

Ele disse, ainda enxugando as lágrimas dos olhos:

“Me diga que isto não aconteceu! Me diga que foi apenas uma boa história que você inventou para me divertir! Isto não pode ser verdade!”

Eu fiquei perplexo com tamanha excitação:

“O pior é que tudo isto foi verdade!”

E minha observação foi motivo para ele rir mais ainda. Ele achava cômicas estas situações. Como, agora, o episódio de Viviane Malone. Que foi frustrante. Ele me ligou apenas para eu saber o quanto irônico o destino foi comigo.

Como se o destino fosse um amigo nosso, ele disse:

“O destino te sacaneou, meu amigo!”

Ele achava que era caso de rir. Mas aconteceu. Por isso eu era cauteloso em relação às atrizes brasileiras. Mas havia uma lista enorme desde a pré-adolescência de atrizes brasileiras que me atraíram. Leila Diniz, Irene Stefânia, Sonia Braga, Sandra Brea, Vera Fischer, Monique Lafond, Alcione Mazzeo, Rose Di Primo, Darlene Glória, Kate Hansen, a lista era enorme. Algumas delas eram amigas minhas no Facebook. Algo que parecia impossível na juventude. Eu trocava comentários que certamente eram esquecidos em meio a dezenas ou centenas de outros. Mas muitas vezes recebia respostas amáveis. Não podia descuidar. O temor de uma destas senhoras, atualmente com idade superior a cinquenta ou sessenta anos, ler um comentário indiscreto e não gostar dele, por prudência, me manteve num território seguro. Era como o vírus. Todo cuidado era pouco. Por isso que nestes tempos de redes sociais em que um comentário feito no litoral do Paraná poderia ser lido em qualquer lugar do mundo vinte segundos teria de ser pensado antes de publicado. O risco com as divas estrangeiras clássicas e inacessíveis eram quase nulos. Elas certamente não se incomodariam com qualquer tagarelice ou inconfidência. A maioria não lia português e muitas sequer compartilhava este mundo conosco. As brasileiras estavam próximas e vivas e algumas até se transformaram em pastoras evangélicas. Havia risco em fazer qualquer inconfidência num ambiente virtual como se fosse uma mesa de bar. O episódio com Sonia Braga foi uma estranha e constrangedora coincidência, mas também um alerta. O episódio recente com Viviane Malone demonstrava que a prudência era necessária Ela tão próxima. A duas quadras da casa em que fiquei. Era estarrecedor

Eu murmurei:

“Por esta eu não esperava!”

Eu lembrei do sonho que tive de madrugada, antes de acordar para preparar as coisas para a viagem:

“Será que o sonho quis dizer alguma coisa?”

Os sonhos dizem alguma coisa. A bíblia está cheia de exemplos. Eles têm um significado. O diacho é que nunca consigo decifrar. Para mim eles sempre foram como hieróglifos. Eu não sou criptógrafo de sonhos. Mas o sonho incomum e enigmático foi o seguinte. Sonhei com um livro de textos sobre futebol chamado “Enfim, craque!”. Até aí tudo bem. O livro foi escrito por Henry Kissinger e publicado pela Editora Schwarcz. Não era Companhia das Letras. Era Editora Schwarcz que é o nome legal da Companhia das Letras. A Schwarcz era uma editora brasileira com filial em Berlim, que também estava publicando o livro, mas em alemão, claro. A Alemanha era a terra natal de Kissinger. Ele nasceu em Fürth e como era judeu os seus pais fugiram das perseguições nazistas para os Estados Unidos em 1938. Kissinger foi para Harvard e virou um bacana nos Estados Unidos. Ele ainda estava vivo com noventa e sete anos. Nem vou gastar tempo falando do sujeito ambíguo que foi na política. Infame principalmente para os países da América do Sul onde incentivou golpes de estado na Argentina, Uruguai e Chile. Mas ele gostava de futebol. O que fazia dele um sujeito estranho porque os americanos gostavam de beisebol, basquete, futebol americano, hóquei, boxe, automobilismo, tudo menos o que chamavam de soccer. Hoje mudou um pouco. Mas não muito. Kissinger gostava tanto de futebol que estimulou o nascimento do Cosmos, equipe de Nova York nos anos 70 que contratou Pelé, Carlos Alberto, Chinaglia e Beckenbauer. Mas este livro com o qual sonhei não existia. Assim como não existia uma unidade alemã da editora que o publicou. Achei o título do livro interessante. Mas era um livro que não existia.

Eu não conseguia estabelecer relação do sonho com coisa alguma:

“Não é possível que este sonho tenha alguma coisa com Viviane Malone!”

Claro que não tinha. Deixei a sala onde atendi o telefonema de Macedônio Hernandez e fui para o quarto de livros pesquisar alguma coisa sobre Viviane Malone. E depois passei a ver fotos dela. A garota que eu amava tinha entre vinte e poucos anos até trinta e oito. A Viviane Malone que foi se refugiar da pandemia em Guaratuba estava com quarenta e nove anos. Era linda ainda. Mas uma senhora. Não era mais a garota que eu gostava. Ou era?

Era motivo para reflexão.

Eu conclui:

“Ainda gosto dela!”

E por quê? Macedônio Hernandez também perguntou no começo do ano quando lhe contei a história de Sônia Braga e lhe falei das atrizes brasileiras de quem gostava.

Ele quis saber:

“Por que você gosta de Viviane Malone”

O argentino achava o rosto de Malone melancólico, embora de candura de mártir, como fosse madona renascentista. Tinha cabelos negros, olhos tristes. Um metro e setenta. Era mineira, filha de engenheiro e pianista irlandesa, de onde veio o sobrenome. A mãe a incentivou a se interessar por arte e ela fez teatro na faculdade. Aos quatro anos foi para a capital do Paraná onde passou dezessete anos e em seguida foi para o Rio de Janeiro. Atuou em trinta e sete produções para a televisão entre novelas e séries especiais e em vinte e três filmes para o cinema. Ganhou meia dúzia de prêmios e passou a desenvolver atividades ligadas aos movimentos populares. Conviveu com o antropólogo Darcy Ribeiro que influenciou seu interesse por causas sociais. Outra influencia foi o bispo catalão Pedro Casaldáliga que a levou a se interessar pelos destinos dos índios brasileiros. Ela o conheceu quando fez um filme no Araguaia. Estas preocupações eram consideradas bizarras nos meios artísticos que cultivam futilidades, vaidades e insignificâncias, mas sempre atraíram minha curiosidade.

Eu pensava com meus botões sobre o interesse dela por índios e pobres:

“Tudo isto é real ou não passa de mistificação?”

Com o tempo achei que o interesse dela era verdadeiro. Estas coisas poderiam sugerir que a vida dela fosse um livro aberto. Nada. Ao seu modo era uma espécie de Greta Garbo. Com muitos segredos. Talvez, ela repetisse apenas o calvário das divinas para chegar ao pedestal em que a admiramos e com ela sonhamos. Todas tinham as suas feridas. Vera Fischer se queixou de um pai violento, nazista convicto que a obrigava a ler Mein Kampf em alemão. Marlene Dietrich, a divina de Anjo Azul, era odiada em seu país por se opor ao III Reich. Ingrid Bergman foi considerada uma devassa por deixar os Estados Unidos para se casar com um cineasta italiano. E assim por diante. Acredito que por isso o destino não quis que conhecesse Viviane Malone. Para o encanto por ela não quebrar quando entrasse no sagrado território de sua intimidade. Era algo semelhante a um livro que não existia além da residência dos sonhos. E para mim restou nada mais que uma frase patética e insignificante para as últimas páginas de minhas memórias se um dia forem escritas:

“Estive quase ao lado dela durante oitenta dias da pandemia. Mas eu não vi Viviane Malone.”

Acho que isso era tudo.

 

10 de August de 2020by edilsonpereira
Crônicas

A Louca do Batel

1B

            No final de junho, por volta das vinte horas, Lionel Lew entrou no elevador de um edifício bacana do Batel arrastando uma dona do sexto andar que estava perturbando os vizinhos. O prédio era o Marquês de Poitiers. Lionel Lew nunca sabia se estes marqueses e duques que os arquitetos da cidade escolhiam para batizar os edifícios existiram mesmo. Mas ninguém estava preocupado com isso. Os bacanas queriam apenas comprar um apartamento no prédio cheio de bacanas e que tinha nome bacana. E estes caras não gostavam de pessoas que não fossem bacanas morando no meio deles. Lola Andrews não era uma bacana. E não combinava com prédio bacana. Pelo menos era o que os bacanas achavam. Lionel Lew teve de arrastar a tipa de seu apartamento para o elevador porque ela se recusou a acompanhá-lo e ainda tentou fazer escândalo.

Ela abriu a porta, viu os dois PMs, quis saber do que se tratava e berrou na maior petulância:

“Quero ver o mandado judicial! Sem ordem judicial não dou um passo para fora do apartamento”.

Lionel Lew estava acostumado com aquela reação. Se fosse arrumar mandado judicial em toda ocorrência para levar gente para a cadeia não faria outra coisa na vida. Ele simplesmente deu um salto, puxou Lola Andrews para o corredor, enquanto Vitório Diniz puxava os braços dela para trás e colocava as algemas nos pulsos. Foi fácil. Ela não esperava tanta agilidade e truculência. Não estava acostumada com isso. Lionel Lew a imobilizou no ato. Era mais forte que ela. Os braços algemados nas costas facilitavam o serviço. O braço direito em forma de gancho em volta do pescoço imobilizava a cabeça dela de encontro ao seu ombro enquanto a mão direita dele tampava fortemente a boca dela para não fazer arruaça num edifício de categoria, arruaça que, no caso, seria gritar feito louca. Aliás, eles chegaram lá justamente porque os vizinhos disseram que não aguentavam mais uma moradora do sexto andar que chamavam de A Louca do Batel. Diniz entrou no elevador atrás do companheiro com a certeza de que não precisava fazer mais nada além de descer com ele em silêncio. Lá embaixo algumas pessoas olhavam com expressão de aprovação e outras de revolta. Para eles, Lola Andrews extrapolou.

            Uma madame de cabelos loiros e lulu no colo disse:

“Parabéns, policial. Tranca ela e não deixa voltar mais aqui!”

            Leonel Lew preferiu não comentar. Lola Andrews foi enfiada na traseira da viatura negra como uma meliante qualquer e vinte minutos depois foi entregue para o delegado Igor Godoy no distrito policial.

            O delegado perguntou:

“O que foi que a mocinha aprontou?”

Lionel Lew respondeu:

“Estava perturbando a ordem pública num edifício bacana do Batel”

O delegado chamou o carcereiro e disse:

            “Coloque a mocinha numa cela. Amanhã, quando ela estiver mais calma, eu converso com ela.”

            O carcereiro perguntou:

“Coloco na cela daquele negão que está tossindo?”

“Isso mesmo. Talvez a música dele acalme ela um pouco.”

            Lola Andrews passou a noite numa cela com um adolescente e com um sujeito mulato de barba e cabelo encaracolado de expressão abatida. O cara tossia, mas parecia sentir frio, porque estava encolhido num canto com os braços cruzados. O cara não estava bem. Pelo menos não ia incomodar. E os dois companheiros de cela de Lola Andrews não incomodaram. O sujeito de expressão abatida tossiu a noite inteira, uma tosse seca. Lola não conseguiu dormir. Ficou também encolhida no outro canto da cela até o dia amanhecer. E quando o dia amanheceu, o delegado não a chamou conforme tinha prometido. Por volta do meio-dia o carcereiro apareceu e disse:

            “Vamos lá conversar com o delegado!”

            Lola Andrews estava morta de sono, cansada e faminta. O delegado parecia ter dormido bem, estava faceiro e tinha acabado de almoçar. Ela deduziu isto porque ele palitou os dentes e depois deixou o palito preso entre os lábios e ficava movendo-o de um lado para outro.

            Ele pegou uma ficha e leu:

“Lola Andrews!”

“Sim, Lola Andrews.”

“Deixa eu ver os documentos.”

Ela pegou no bolso da calça e mostrou.

O delegado Godoy pegou e leu:

“Gustavo Bueno de Souza. Trinta e dois anos.”

Ele olhou para ela perguntou:

            “Com um nome bonito desse por que você anda por aí dizendo que é Lola Andrews?”

            Ela respondeu indiferente:

“É meu nome artístico. O nome do RG eu não uso.”

Ele devolveu o documento e disse:

“Artístico, é? O que você faz?”

“Sou dançarina.”

“Onde?”

“Na Boate Noturno.”

            O delegado conhecia o pessoal da Noturno. Era amigo do gerente. Boate chique. De categoria. De vez em quando passava por lá para conferir o ambiente e tomar um uísque duplo na faixa. Não ia criar caso com eles.

            Ele perguntou:

“Mas a Noturno está fechada desde o início da pandemia?”

“Está.”

“Eu conheço o pessoal da Noturno. Boa casa. Como foi parar lá?”

Ela disse:

“Tenho um bom currículo. Trabalhei na Europa. Em Roma e Zurique. E no Japão.”

Ele não tinha muito o que perguntar. Mas ficou curioso:

“Não tenho nada com isso. Mas você é dançarina, o negócio aí embaixo não atrapalha?”

Ela sabia que aquilo era abuso. Não tinha obrigação de responder aquele tipo de pergunta.

Mas respondeu para não se complicar:

“Eu não tenho.”

O delegado se espantou:

“Não?”

Ela disse:

“Fiz cirurgia de resignação sexual na Tailândia há cinco anos.”

“Mas isso deve ser uma nota. Quem pagou?”

“Meu namorado. Foi ele também que pagou o apartamento no Batel.”

O delegado balançou a cabeça admirado. Ele sabia que tinha louco para tudo neste mundo.

Ele observou:

“Este cara deve gostar muito de você!”

“Sim, gosta. Eu também gosto dele.”

Bom. Ele tinha que entrar no assunto:

            “Tudo bem. Mas este negócio de bailarina não dá a você o direito de fazer escândalo por aí!”

            Lola Andrews se espantou:

“Escândalo? Eu odeio escândalo!”

“Mas está aqui. Pelo menos dez pessoas ligaram dizendo que você é a Louca do Batel.”

Ela moveu os ombros indignada e disse:

“Que horror! Nunca soube que sou a Louca do Batel.”

O delegado disse:

“Mas parece que agora é. Está aqui.”

            Ele podia liberar a dona. Era apenas um caso de perturbação da ordem. Isto acontecia todos os dias. Geralmente, todas as noites. Mas o movimento estava fraco e ele achou que podia esticar conversa um pouco.

            “Perturbação da ordem. O que você fez?”

Ela disse desafiadora:

“Ninguém contou?”

“Não.”

            “Engraçado! Estes bacanas ligam para cá, dão a versão deles, vocês vão no meu apartamento, me arrastam para cá, me jogam numa cela que tem um sujeito tossindo a noite toda e só no dia seguinte me perguntam o que eu fiz.”

            O delegado pensou que ela estava certa. Mas isto não era problema dele.

            “Quem deveria ter feito isso eram os PMs que atenderam a ocorrência. Eu apenas recebi a encomenda. E agi de acordo com o ritual. Imagine se é um caso de periculosidade e solto você. Sobra para mim. E ontem quando você chegou eu já estava fora do expediente.”

            Lola Andrews achou melhor não se encrespar com o delegado. Não tinha nada a ganhar com isso.

            Ela disse:

            “A perturbação da ordem, delegado, foi que eu comecei a pedir para as pessoas do edifício que subiam no elevador para usarem máscaras. Entravam duas ou três pessoas todas sem máscaras. Lá embaixo aquela aglomeração no hall e na calçada. Não sei se o senhor sabe que estamos no meio de uma pandemia.”

            O delegado moveu o palito de dente na boca e disse, tentando fazer ironia, mas a cara não ajudou, porque ele não riu:

            “Fiquei sabendo.”

            “Pois é. Todo mundo agindo deste jeito e dizendo que este negócio de vírus era histeria coletiva. Que não ia entrar nessa. Gente dando festas e fazendo churrasco e convidando os amigos. E este pessoal circulando como se nada estivesse acontecendo. Claro que fiquei revoltada. Mas eu alertava um, alertava outro e eles começaram a me ameaçar.”

            “Ameaçar como?”

            “Que se eu não parasse de encher o saco iriam me denunciar por perturbação da ordem pública.”

            “E foi o que fizeram.”

            “Eu sei. Mas veja o senhor. Eu sou diabética. Sou cardíaca. Se pego a merda deste vírus, eu vou pro saco. Sem contar que devo ter imunidade baixa por causa da cirurgia que fiz na Tailândia. Por isso minha irritação. Mas não sei se o senhor percebeu. Está a maior gandaia. Todo mundo andando nas ruas sem máscara, bares cheios, crianças no shopping. Isto não vai acabar bem.”

            O delegado fez uma cara de preocupação:

“É. Não está fácil. O povo não está colaborando. E pelo jeito não está acabando bem.”

“Delegado, as UTIs dos hospitais estão ficando lotadas. Vai começar a faltar leitos. Pessoas vão morrer em casa. O Ministério da Saúde não está enviando medicamentos para os estados. Não temos um ministro da Saúde. Nós estamos vivendo um caos. Agora me diga uma coisa.”

O delegado olhou para ela e perguntou desconfiado:

“O que você quer saber?”

Lola Andrews indagou:

“Eu estou tendo algum pesadelo? A pandemia acabou e não estou sabendo? Tudo voltou ao normal e esqueceram de me avisar?”

O delegado respondeu sem entusiasmo:

“Parece que não acabou.”

            “Doutor, os números de infectados e mortos estão disparando. E o senhor sabe porque. Porque esta gente não está se cuidando. Este povo é um bando de homicidas. E pessoas que estão nos grupos de risco como eu somos as maiores ameaçadas.”

            A conversa foi longe demais, pensou o delegado. Lola Andrews estava certa mas ele não podia fazer nada:

            “Não adianta você falar tudo isto pra mim. Eu não sou do governo, não sou médico e não tenho autoridade no assunto.”

            Lola Andrews estava furiosa. E quando ficava furiosa costumava fazer besteira. Por isso tentou se acalmar. O delegado realmente não tinha nada com isso. Ela não podia fazer besteira numa delegacia. Era a formas mais simples de voltar para a cela. Ela não era otária. Se fosse olhar bem, o delegado era apenas um intermediário naquela zorra toda. E, pior, se ele fosse colocar na cadeia todo mundo que estava colocando as pessoas em risco, não ia ter cadeia no país para todo mundo.

            Ela disse:

            “Eu sei, delegado. Estamos conversando porque eu que estou há mais de três meses de quarentena, dei o meu cachorro para um amigo para não ter que descer todos os dias para passear com o animal, só saio para fazer compra no supermercado, superprotegida e quando chego do mercado lavo as compras. Tomate por tomate, sabe o que é isso? Só Deus sabe o trabalho que eu tenho para ficar longe deste maldito vírus!”

“E você está certa agindo assim.”

“E vim parar na delegacia porque estou fazendo as coisas certas e revoltada com quem não faz.”

            O delegado olhou para ela. A conversa foi longe demais. Ele não estava gostando mais dela.

            Ele disse:

            “Olha, Lola Andrews. Eu sei que você tem razão. O país está virado do avesso. Mas eu não posso fazer nada a não ser mandar você de volta para casa e pedir para continuar se cuidando. Só isso que posso fazer.”

            Ela sabia que ele não podia fazer mais que aquilo.

Ela abaixou a cabeça e disse:

“Só isso?”

Ele disse:

            “Só. Agora pega as suas coisas e vai para casa. E se não se importa que eu lhe dê um conselho, pare de reclamar com as pessoas de seu edifício para não arrumar mais confusão. Não é fácil, mas vai ser melhor para você.”

            Lola Andrews se levantou e foi embora em silêncio, humilhada e ofendida.

            Esta história terminaria aqui não fosse Lionel Lew aparecer no começo de agosto na delegacia e procurar o delegado Godoy.

            Ele perguntou:

            “Lembra aquele moreno que a gente trouxe no final de junho para cá?”

            O delegado disse:

“Não lembro. Vem tanto moreno para cá que não guardo a cara de ninguém.”

“Mas o senhor lembra da traveca do Batel.”

            O delegado pensou. Ele conversou tanto tempo com ela que não tinha como esquecer.

            “Sei. Lola Andrews!”

Lionel Lew disse:

“Não. A Louca do Batel.”

O delegado esclareceu:

“Lola Andrews é a Louca do Batel.”

“Não sabia.”

“O que tem ela?”

“Começa com ele. Com o moreno. O cara morreu de Convid no HU.”

O delegado abriu a boca de espanto e murmurou:

“Caraca!”

“Eu fiquei sabendo e fiquei cismado.”

“Cismado por quê?”

“Por duas coisas. Primeira que eu trouxe ele para cá. Fui fazer exames. De repente eu podia ter sido infectado.”

“E daí?”

“Ainda bem que deu negativo. E depois fiquei pensando.”

“Pensando em quê?”

“Na Louca do Batel. Porque ela ficou na mesma cela que o moreno naquela noite.”

O delegado pensou e concluiu:

“Realmente. Agora recordo. Ficou mesmo.”

“Então voltei lá no edifício do Batel para saber como ela estava.”

Agora o delegado entendia a dimensão do drama.

Ele ficou assustado:

“E aí, como ela estava?”

“Ela está entubada muito mal no Trabalhador.”

            O delegado se lembrou que ela disse que era de grupo de risco. Diabete, coração e tinha ainda a cirurgia que fez na Tailândia.

Ele murmurou mais uma vez:

“Caraca! Que merda!”

            Lionel Lew fez cara maliciosa. O delegado percebeu que ele tinha mais coisa para contar.

            Ele perguntou:

“E tem mais?”

Lionel Lew disse:

“Agora vem a parte mais importante.”

O delegado ficou pálido. Se tudo aquilo não era importante, o que seria?

Ele repetiu na forma de pergunta:

“A parte mais importante?”

            Lionel Lew sorriu e balançou a cabeça. O delegado estava interessado e ansioso. Lew sabia e o suspense fazia parte da narrativa. Ele foi na delegacia para contar para o delegado.

Como o delegado ficou em silêncio, ele repetiu:

            “Isso mesmo. Quando soube que estava infectada, a Louca do Batel ficou tão revoltada que infectou quem pode antes de ir para o hospital.”

“Caraca!”

“Mas desta vez ela não fez escândalo.”

O delegado implorou:

“Para de fazer onda e conta logo esta merda.”

            “Ela simplesmente passou a andar de lá para cá no edifício sem máscaras, pedindo desculpas para as pessoas, apertando as mãos, descendo e subindo no elevador. E todo mundo achando que ela mudou da água para o vinho. A vingativa fez o que pode.”

            “Isso é criminoso!”

            “Ela deve ter infectado pelo menos uns dez que em suas casas infectaram mais uns trinta.”

“Porra!”

“Uma velhinha morreu e três outros estão entubados na UTI do Marcelino Champagnat.”

            “Caraca!”

            “O pessoal do prédio ficou sabendo que foi a Louca do Batel. E ficou revoltado, claro. Gente querendo matá-la e outros querendo processá-la. Mas pelo jeito não vai ser possível.”

            O delegado Igor Godoy se lembrou do dia em que conversou com Lola Andrews. Ele achava injusto o que fizeram com ela. E agora não sabia se era justo o que ela fez com eles. Até aquele momento era a história mais chocante da pandemia que apareceu no distrito.

            Ele olhou para Lionel Lew, balançou a cabeça atordoado e murmurou:

            “Caraca!”

Lionel Lew disse:

“Esta foi foda, delegado!”

 

 

 

4 de August de 2020by edilsonpereira
Crônicas

As lágrimas amargas de Urbano Carneiro

1

            Nos últimos cinco anos Félix Caldeira constatou na prática o que sabia há muito, talvez bem antes de sua juventude:

            “Grande parte da sociedade odeia velhos e perdedores!”

            Félix Caldeira era um velho. Viúvo e aposentado. Perto dos setenta anos. Apartamento na capital e casa em Rio da Praia, como também era chamado o Balneário de Coroados, a algumas centenas de metros de Santa Catarina. Comprou-a há vinte anos quando a região era mais inóspita. Agora, com rapidez, mansões vão ocupando espaços vazios que ainda são muitos. Com o tempo, ele reformou a casa que ficou agradável, embora enorme para uma pessoa. O filho mora no apartamento na capital onde Caldeira tem quarto intocado para quando desejar subir a serra.

            Mas ele vai pouco para a capital. Não tem mais nada lá. Nem amigos. Os conhecidos desapareceram. Muitos morreram. Ele acostumou a caminhar solitário pela praia de manhã e no fim do dia. Praia deserta nove meses por ano.

            E todo dia, conclui satisfeito:

“Estou bem aqui.”

Principalmente porque sabia que grande parte da sociedade odeia velhos e perdedores. Ele não foi um vencedor, pelo menos achava isso. Mas estava longe de ser perdedor. Agora, era velho. E não guardava mágoas. Apenas estranhava o fato de este sentimento com os velhos e perdedores ser fortemente arraigado nas camadas mais pobres e humilhadas da sociedade onde se encontram o maior número de velhos e perdedores.

“Isto não faz sentido.”

Mas era assim. A repulsa aos velhos e perdedores nem sempre se manifestava de forma clara. Na maior parte dos casos era dissimulada. No entanto, o desdém era fácil de ser notado. Bastava observar a reação de alguém diante da aproximação de um velho ou perdedor. Não era de simpatia. No máximo de tolerância. Talvez, naquela região profunda do cérebro desta gente se cristalizou a vaga esperança de obter vantagem com a aproximação de um jovem ou vencedor. Existem vencedores em razoável quantidade na forma de milionários, ricos, burgueses, patrões e chefes de departamentos nas empresas e nas repartições públicas, além de políticos, esportistas famosos e artistas badalados. Sem contar os bem sucedidos pastores neopentecostais que com  alguns anos de atividade compram mansões em Miami. A sociedade era complexa e existiam muitas atividades em que se podia vencer. Félix Caldeira encontrou centenas, talvez milhares de pessoas nas longas décadas de vida que personificaram a subserviência e servilismo diante de um vencedor. E quando pensava nisto, ele se lembrava quase imediatamente de Urbano Carneiro.

Era um típico integrante desta fauna humana que conheceu no último emprego:

            “Nenhum foi tão servil quanto ele!”

            Félix Caldeira estava longe nos últimos cinco anos de todas as pessoas com as quais conviveu nos quase vinte anos anteriores na editora em que trabalhou como chefe do almoxarifado. Não era grande coisa, mas era chefe. Para alguns, apenas um burocrata. Para outros, uma pequena forma de vencedor porque havia pessoas que dependiam dele. E que o chamavam de chefe.  Ele teve muitos colegas e conhecidos, alguns amigos e ficou sozinho quando deixou de ser chefe e saiu do emprego. Situação que contribuiu para ir morar no litoral.

“Foi a melhor coisa que eu fiz!”

Bem, não perdeu nada na capital. Quase todos os amigos e antigos colegas desapareceram. Simplesmente sumiram. Menos um. Diamantino. Ele foi todo este tempo uma espécie de periscópio sobre os outros, sobre o que acontecia na capital. Por isso Félix Caldeira sabia que uns morreram, outros se aposentaram e também, como ele, alguns mergulharam na obscuridade. Quase todos os dias Diamantino enviava informações dos mais variados tipos sobre o que acontecia na capital, no país e no mundo, embora Caldeira também tivesse o hábito de se informar através da internet.

            Na manhã deste primeiro domingo de agosto ele perguntou:

“Sabe o que aconteceu com Urbano Carneiro?”

Quase em seguida veio a mente de Caldeira, como uma ficha criminal, toda a vida de Urbano Carneiro que ele conhecia. A que soube através de informações dos colegas da editora quando trabalhava e a dos anos de convivência:

Caldeira pensou:

“O que aconteceu com o Carneiro?”

Caldeira conheceu Carneiro em agosto de 1996. Quando foi contratado pela editora. E isto aconteceu porque alguns meses antes, em março, ele perdeu o emprego de chefe do almoxarifado da Empreza Lithographica Garammond, em São Paulo, onde morava e trabalhava. A Garammond era uma das mais tradicionais empresas do setor gráfico no Brasil e uma das maiores da América Latina. Caldeira tinha orgulho de trabalhar lá. Bom salário, plano de saúde, vales alimentação e transporte. Ele se via tranquilamente caminhando para uma aposentadoria agradável numa casa em São Sebastião a poucos metros do Oceano Atlântico. O terreno já tinha comprado em 1991. Havia tempo pela frente para construir a casa. E não havia pressa. O importante era que o futuro estava traçado. Mas tudo mudou com a demissão. Vários elementos contribuíram para ela ocorrer. Caldeira estava com quarenta e cinco anos e foi considerado velho.

Muitas vezes, ainda hoje, ele pensa:

“Hoje não me sinto velho. E sou um velho. Naquele tempo entrei em pânico quando me disseram que eu era velho.”

Foi o primeiro contato com a repulsa aos velhos. Ele estava no lado frágil. Havia nas empresas então um culto à juventude. Os vinte e cinco anos de casa também pesavam, porque serviram para robustecer o seu salário. Com a metade dele era possível contratar para o posto um jovem ambicioso e cheio de energia. A fidelidade e dedicação de Caldeira não valiam nada. Os novos diretores as interpretavam como uma espécie de conformismo e indolência. E repetiam que a empresa queria pessoas jovens, dinâmicas e inconformistas. Também estava em voga a cultura de enxugamento da máquina administrativa e com as novas técnicas e rapidez dos fornecedores o almoxarifado foi elevado a categoria de setor ultrapassado que poderia ser substituído por uma empresa terceirizada, mais ágil e barata. O certo foi que de uma hora para outra as pessoas deixaram de falar com Caldeira e aquilo era um sintoma de que algo ruim iria acontecer. Em poucas semanas soube o motivo. Seria demitido. Durante três meses e meio procurou emprego em São Paulo. Mas os motivos acima, que levaram à demissão, eram os mesmos que o impediam de ser contratado. A sua mulher, Lizia, sugeriu que ele deveria procurar emprego fora de São Paulo. Ela gostava de Curitiba, a princípio porque se acostumou a ouvir e ver no noticiário televisivo notícias otimistas do lugar. Depois, eles passaram férias várias vezes na cidade, o que reforçou o interesse. Ela sugeriu e sem nenhuma esperança Caldeira procurou informações e na primeira entrevista de emprego ele foi contratado pelo comendador para ser o chefe do almoxarifado da editora que publicava dois jornais na capital paranaense.

Foi o próprio comendador que o contratou.

Ele disse:

“Você vai trabalhar comigo na editora. Gostei de você.”

Caldeira ficou perplexo. Ele achou que o fato de ter trabalhado na Garammond teve grande peso na decisão do comendador. Ele voltou para São Paulo e informou a mulher que conseguiu emprego. Caldeira vendeu o apartamento na capital paulista, vendeu o terreno em São Sebastião porque os planos de construir casa no litoral norte de São Paulo ficaram impraticáveis e considerou que eles poderiam ser aplicados no litoral paranaense, onde os preços de terrenos eram mais baratos. Com o dinheiro da venda do terreno em São Sebastião comprou casa em Rio da Praia, em Guaratuba. O terreno em que ficava era maior. Atraiu-o a rusticidade do lugar. E também gostou da casa que com o tempo reformou. Com o dinheiro da venda do apartamento comprou outro no Juvevê em Curitiba. Aos quarenta e cinco anos, e considerado um velho na Garammond, não poderia reclamar da vida. Ele se mudou para uma cidade que a mulher achava melhor, estava empregado embora o salário fosse menor, mas o dinheiro que recebeu da demissão ainda estava no banco. Era dinheiro do Fundo de Garantia reforçado com a multa de quarenta por cento sobre o valor até então recolhido e depositado.

Caldeira parou para pensar e concluiu:

“Minha vida não ficou ruim.”

Claro que ele estranhou algumas coisas na nova cidade. A editora era uma bagunça assustadora. Mas, em compensação, ninguém, muito menos o comendador, parecia se preocupar com isso porque o grosso do dinheiro de seus jornais vinha de anúncios e verbas publicitárias do governo do estado e da prefeitura com os quais o comendador tinha bom relacionamento.

Então era seguir o ritmo da nova música.

“Então você é o novo chefe?”

Foi assim que o sorridente Urbano Carneiro se apresentou.

Ele disse:

“Eu sou um faz tudo por aqui.”

Caldeira não demorou para descobrir que o faz tudo ficava por conta do servilismo. Ele era motorista da editora. Não da redação. Mas para outras atividades, transporte de bobinas, compras, levar jornais para a rodoviária e bancas, coisas do gênero, incluindo trabalhos pessoais para o comendador, como compras de mercado, transporte de alguma coisa para as fazendas que ficavam no norte do estado e tudo o que o comendador, a mulher do comendador e as filhas pedissem. Foram estes serviços que garantiram dez anos mais tarde a recontratação quando um destes profissionais que fazem levantamentos nas empresas destinados a aperfeiçoar as relações entre departamentos e eliminar funções improdutivas indicaram que Carneiro e mais quinze funcionários deveriam ser demitidos por serem desnecessários. Foi um choque para Carneiro. O comendador já era um octogenário e queria se desfazer dos jornais. Mas precisava, antes, para tornar a venda atrativa, reduzir ao máximo o que os compradores chamavam de passivo trabalhista.

Carneiro saiu abalado da editora. Quando encontrou Caldeira ele disse sem entender:

“Me disseram que eu sou um passivo trabalhista!”

Mas ele não desistiu. E não deixou de frequentar a cozinha do comendador e de quebrar os galhos para a mulher e filhas de seu antigo patrão. Até que este, por influência delas, o recontratou, agora para ser motorista da redação. Rapidamente, Carneiro tratou de se proteger candidatando-se e sendo eleito para a Comissão Interna de Proteção de Acidentes, que garantia pelo regulamento interno estabilidade por três anos. E foi esta precaução que que nunca deixou de ter, nas eleições seguintes, que lhe garantiu permanecer no emprego mesmo depois de o comendador vender a editora com os dois jornais para um antigo concorrente que depois de alguns anos fechou os dois jornais e manteve, assim mesmo, Carneiro na empresa, porque ele tinha estabilidade.

Caldeira pensou:

“Esse é o Carneiro!”

Assim que chegou na editora, Caldeira perguntou para Diamantino, que era editor de economia bem antes de ser promovido a editor-chefe de um dos jornais e trabalhava na empresa há cinco anos:

“Como Carneiro foi contratado se ele não segue os menores padrões profissionais?”

Diamantino riu e disse irônico:

“Singularidades da editora!”

Em seguida acrescentou:

“Ele é um sabujo de marca maior. Mas é gente boa.”

“Mas isto não responde a minha pergunta.”

“O pai dele é o major Carneiro. Gregório Carneiro. Ele queria que o filho virasse militar. Pai sonha o melhor para o filho. E o major sonhava que o filho viesse a ser general.”

“General!”

“O general que ele não foi. Ele queria ser outro general Carneiro.”

“Nem sabia que existiu outro.”

“Existiu. Mas o Carneiro filho do major não passou de sargento. Carneiro é alto, forte, mas devagar. Não tem disciplina e se você apertar ele não tem conhecimento profundo em nada. Na gíria militar, é um folgado. O major viu que ele ia passar a vida no quartel e não iria longe no exército. Então achou melhor tirar ele de lá. Ele pediu para o comendador arrumar um emprego para o Carneiro na editora. Pelo menos não ia passar vergonha quando encontrasse antigos companheiros de farda na sauna do Clube da Urca e eles indagassem como estava a carreira militar do filho. O comendador e o major eram amigos. Além disso, o comendador gosta de fazer favores, porque sabe que pode precisar da pessoa mais adiante. E ele sempre cobra um dia.”

Caldeira disse:

“Entendi.”

Diamantino riu e disse:

“Ainda bem. Porque não entendi até hoje.”

Carneiro rapidamente ficou amigo de Caldeira na editora. O que não era espantoso porque se dava bem com todo mundo que estivesse acima dele. Estava sempre pronto para qualquer tarefa da empresa ou fora dela. Durante anos foi prestativo. E tudo acabou quando soube que Caldeira seria demitido, porque estava velho e aposentado. E desta vez era verdade. Estava velho e aposentado. Caldeira se aposentou na editora e continuou trabalhando mais quatro anos depois da aposentadoria. Não havia nada de ilegal. Um dos motivos que o levou a continuar no emprego foi a morte da mulher. Temeu entrar em depressão. Quatro anos depois achava que era hora de se recolher. Desta vez não achou ruim a demissão. Mas não gostou da mudança de comportamento de Carneiro. Ficou grosso e mal-educado. O servil se transformou num arrogante truculento. Não deixou de ser surpresa. Caldeira e Diamantino foram demitidos no mesmo mês. Novembro de 2015. Carneiro afastou-se de Caldeira e de Diamantino, como se os dois estivessem infectados. Não tinham mais serventia para ele. Não seriam mais chefes e ele tinha o salvo-conduto da estabilidade no emprego em decorrência da função de representante dos trabalhadores na Cipa. E se Caldeira depois de se mudar para Rio da Praia ficou sabendo dos passos seguintes de Carneiro foi através de Diamantino que nunca deixou de conversar com o amigo pelo celular, fosse numa ligação ou pelo Whats App. Ele sempre tinha alguma novidade. E começava cada uma com perguntas do tipo, lembra de fulano? E agora, como sempre fazia quase todos os dias, entrou em contato pelo celular e fez a pergunta:

“Sabe o que aconteceu com o Urbano Carneiro?”

Caldeira perguntou:

“O que aconteceu com o Carneiro?”

Diamantino respondeu:

“A mãe dele morreu!”

“Caralho!”

“Pois é!”

Aquilo era terrível porque a mãe era a coisa mais valiosa que Carneiro tinha, depois de perder o pai. Pelo menos era o que alardeava para todos que o conheciam. Se bem, também, que embora não tivesse nenhum problema grave de saúde, ela estava com mais de setenta anos. Uma idade em que morrer não chega a ser novidade. Principalmente se for com os outros e não com as pessoas próximas e de quem a gente gosta. Mas era terrível porque Carneiro gostava da mãe dele e sem ela estaria sozinho no mundo. Embora tivesse muitas namoradas em sua vida, não casou com nenhuma e não teve filhos.

Caldeira perguntou, porque não lhe ocorreu coisa melhor:

“Coração?”

Diamantino respondeu:

“Convid!”

Aquilo era trágico. Entrava no drama do momento. A morte traiçoeira que todos temiam.

Caldeira exclamou, sincero:

“Caralho!”

Diamantino disse:

“Pois é!’

“E como foi?”

“Carneiro passou o vírus para a mãe. Ele era forte, pegou o vírus, ficou assintomático e não sabia. A velha não era tão forte quanto o filho, pegou e morreu.”

“Caralho!”

“E você sabe que ele não parava quieto, não acreditava no vírus, achava que era onda e politicagem, aquelas bobagens que estes caras falam e sujeitos de juízo mole como o Carneiro acreditam. Ele não ficava em casa e só gostava de andar com gente bacana, que nem o Adamastor que tem dinheiro para comprar carros importados porque o pai é um bacana do Tribunal de Contas. Carneiro pegou e nem  percebeu. Quando a mãe morreu, ele não acreditou e disse que ela não saia de casa. Fizeram exames com ele e deu positivo. Aí, bingo. Foi ele.”

“Caralho!”

Aquilo era terrível. E de uma ironia cruel. Carneiro seguiu a onda conservadora e foi um dos votos que ajudaram a eleger a extrema-direita. O que não surpreendia, porque certamente movido pelo complexo de rejeitado pelo exército ele queria provar que era herói de alguma forma e engrossou as multidões que pediam em protestos para os militares darem um golpe do estado e acabar com a democracia. Era uma coisa de louco. No começo do ano, quando houve confronto entre simpatizantes do governo de extrema-direita e as entidades médicas que pediam rigor no isolamento social para se prevenir contra o crescimento das contaminações do vírus, ele saiu sorridente de camiseta amarela em manifestações nas principais ruas da capital com um cartaz em que se lia:

“Foda-se o vírus!”

Adamastor empunhava outro cartaz ainda mais atrevido:

“Vírus, vem ni mim!”

Diamantino disse que o vírus foi até o Adamastor. Carneiro descobriu depois de fazer seus exames que o amigo também foi contaminado antes dele e não contou por medo de rejeição. E assim passou para Carneiro que passou o vírus para a mãe. E a velha morreu.

Diamantino mandou uma figurinha pelo Whats App:

“The life snake!”

Era um trocadilho infame que fazia sentido se traduzido para o português. E se a tradução fosse “a vida cobra”.

Caldeira perguntou:

“E como ele está?”

Diamantino respondeu:

“Está arrasado, naturalmente. Eu não sei se ele está mais arrasado pela morte da mãe. Ou se pelo fato de ele ter provocado a morte da mãe. Mas que está um bagaço, não resta dúvida. Ele me procurou. Queria conversar. Ele veio aqui no instituto e eu ouvi. Dois metros longe, de braços cruzados e com máscara. Foi uma situação difícil. Não podia fazer nada a não ser ouvir. Ele disse que nunca chorou lágrimas tão amargas quanto aquelas. Ele disse que suas lágrimas pareciam suco de jiló.”

Caldeira achou melhor mudar de assunto e perguntar sobre a situação geral:

“Estão falando que a pandemia chegou no platô! Isso é verdade?”

Diamantino trabalhava de assessor num instituto do governo. Ele tinha informações. Mas não podia abrir tudo o que sabia.

Ele, pelo menos, foi sincero:

“Olha, cara, nem sei o que dizer. Estão falando isso. Mas com a abertura generalizada, está sendo um festival de contaminações e de mortes. Se tivessem feito tudo certo desde o começo, agora neste início de agosto era para a situação estar controlada, com menos mortos e em declínio. Só o que sei é isso.”

“Você não acha que o governo deveria ser mais rígido?”

“Achar eu acho. Mas não ia adiantar. A maior parte das pessoas age como o Urbano Carneiro. De forma irresponsável e inconsequente. E ainda se acorrenta diante da prefeitura para abrir tudo. Só vão entender a gravidade do assunto quando a mãe morre. O prefeito não vai enfrentar uma multidão em nome do bom senso. Nem o governador. Eles seguem a onda. Quando o governador tentou fazer um arremedo de lockdown, o mundo caiu de pau nele. Pior que a adesão ao isolamento em duas semanas foi baixa. Desmoralizou a iniciativa.”

“É. Tem isso.”

“Por isso que esse negócio de platô tanto pode ser do jeito que estão falando como pode não ser. O que eu sei é que a situação simplesmente saiu do controle. E não sei como e quando vai terminar. Você tem sorte. Está num lugar deserto e seguro. Não saia daí.”

Caldeira disse:

“Estou me cuidando!”

Diamantino tinha razão. Se a maior parte da sociedade tivesse um mínimo de bom senso, o país não teria chegado a situação em que chegou. Em todos os sentidos. Eram milhões de Urbanos Carneiros preocupados com o próprio nariz, seguindo pessoas que consideravam vencedoras e que na realidade eram apenas uns escroques se aproveitando de seus semelhantes. Alguns, como Urbano Carneiro, não aprendiam nem depois de verterem barris de lágrimas amargas.

3 de August de 2020by edilsonpereira
Crônicas

A Madame do Luluzinho

dama

            Primeira segunda-feira de agosto. O dia amanheceu frio. Logo cedo, a primeira coisa que ele notou depois de dar a ração para a cachorra, foi que a Cefalexina 300 mg acabou. Era simples, pensou depois de voltar do passeio matinal com o animal e deixá-lo trancado em casa. Teria de comprar mais cápsulas. Ele foi andando até a Clínica e Aviário Arca de Noé para comprar mais quatro cápsulas de sete comprimidos cada uma para passar o mês. Remédio para o problema crônico de pele da cachorra. As irrupções cutâneas. A Arca ficava duas quadras da casa em que estava. Mas ao chegar encontrou-a fechada. Era a melhor e mais completa loja de produtos para animais do litoral, com boa clínica anexa. O vigia com máscara e luvas negras na frente da loja dava informações para uma mulher também com máscara e luvas de plástico, segurando um imperturbável golden retriever pela guia. Ele informou que o veterinário Guilherme, a auxiliar Mercedes que dava banho nos animais e era gerente do Pet Hotel e mais duas funcionárias do aviário estavam de quarentena. Todos pegaram o vírus.

A mulher do golden retriever se espantou:

“E agora, como fica?”

O vigia explicou paciente que seriam, no mínimo, duas semanas sem clínica veterinária, sem aviário e sem banhos para os animais. Esta era a notícia ruim. A notícia boa era que ninguém estava passando mal. Os infectados estavam tomando os remédios que o médico receitou e se tudo corresse bem a previsão era de em quinze dias estar de volta, porque se passaram sete dias do fechamento da clínica pela saúde pública e fazia mais sete que eles estavam infectados. A mulher do golden retriever ainda continuava perplexa:

“Todos pegaram o vírus? Como assim?”

O vigia explicou:

“Foi a Madame do Luluzinho.”

A mulher e nem ele conheciam a Madame do Luluzinho.

            O vigia devia estar acostumado a perguntas porque explicou fleumático como soldado inglês do Palácio de Buckingham:

            “É a Dona Anna Santiago do Amaral. Uma madame da capital. Cliente antiga da clínica do doutor Guilherme.”

O vigia chamava o veterinário de doutor, talvez porque fosse seu patrão. Ou, talvez, porque em sua cabeça se o profissional que cuidava da saúde dos homens era chamado de doutor, o que cuidava da saúde dos animais também deveria ser chamado de doutor porque no fundo tanto os homens quanto os cães e gatos eram animais.

Ele continuou:

“A família de Dona Anna tem casa na cidade há mais de quatro gerações. E uma vez por mês ela desce para ver se o caseiro está cuidando bem da propriedade. Ela tem um luluzinho branco. O cachorro é o maior xodó de sua vida. Ela chama o cachorro de filhinho. O pessoal da clínica chama ela de Madame do Luluzinho.”

            O relato em vez de acalmar a mulher a irritou:

“E como ela trouxe o vírus para a clínica?”

O vigia continuou paciente:

“Sabe como são as madames. Elas acham que o vírus pega em todo mundo e não nelas. Ela apareceu aqui sem máscara, sem álcool gel, sem luvas de proteção, sem nada. Apareceu com o luluzinho no colo com uma guia amarela para o doutor Guilherme dar uma olhada. Ela trouxe o bichinho porque ele chorou à noite. O doutor tratou o animal e ela foi embora.”

“E como sabem que foi ela?”

O vigia explicou mais uma vez:

            “Acontece que ela voltou para a capital poucos dias depois e sentiu os sintomas. Ela fez os exames e deu positivo. Estava com o vírus. Pegou antes de vir para cá. Então avisou o doutor Guilherme. Ele fez os exames e também deu positivo. Mercedes e as duas moças da loja também fizeram e deu positivo.”

            A mulher balançou a cabeça indignada e disse sem papas na língua:

            “Esta vagabunda filha da puta desce a serra só para trazer o vírus para o litoral.”

            O vigia não disse nada. Talvez, no íntimo, concordasse com a mulher do golden retriever. Só não podia dizer isso porque a Madame do Luluzinho era cliente do doutor Guilherme. E se ele dissesse alguma coisa e o veterinário soubesse poderia perder o emprego. Havia poucos empregos no litoral. E aquele era moleza. Em boca fechada não entra mosquito,  pensou.

            A mulher, por falta de resposta do vigia, olhou para o homem que apenas ouvia e disse;

“Era só o que faltava. Era só o que faltava.”

            Em  seguida ela se afastou com o golden retriever. O homem também se afastou. Tudo que precisava saber soube sem esforço. Então ele teria que andar mais cinco quadras até a rua principal, onde havia a segunda melhor clínica da cidade. A Beethoven, O Magnífico. O nome pode à primeira vista parecer estranho para uma loja de produtos para animais, mas os amantes de filmes com cachorros certamente devem saber que se trata de uma bem sucedida película cinematográfica norte-americana de 1992 em que o personagem central é um São Bernardo. Ao chegar na rua principal, o homem tomou cuidado de andar na calçada oposta a da Caixa Econômica. Havia uma aglomeração de pessoas diante da agência. Uma parte sentada em cadeiras dispersas e outra encostada na parede. Todos de máscaras e a maior parte conferindo alguma coisa no celular. Certamente receberam senhas e esperavam serem chamadas para receber o auxílio emergencial de seiscentos reais por mês que o governo federal estava dando para as pessoas que ficaram sem emprego, como uma forma de elas tentar sobreviver durante a pandemia. Mais adiante ele também evitou a calçada oposta em que estava a agência do Bradesco. Havia filas para usar o caixa eletrônico. As pessoas estavam usando máscaras, mas muito próximas umas das outras. Todo este esforço foi inútil porque ao chegar na loja de produtos para animais, ela também estava fechada. A chinesa dona do restaurante Shing Ling, que na pandemia atendia apenas pelo sistema delivery e que ficava ao lado da Beethoven, O Magnífico, explicou que o fechamento da loja foi provocado pelo vírus.

            Ele perguntou:

“Também?”

A chinesa respondeu:

“Também.”

Ele indagou sem acreditar:

“Todo mundo?”

A chinesa respondeu:

“Todo mundo.”

Este todo mundo eram duas pessoas. Duas irmãs.

“E como isto aconteceu?”

“Foi Madame do Luluzinho!”

“Ela também?”

“Sim.”

            A chinesa usava máscara e luvas. E devia estar explicando o motivo do fechamento da loja de produtos para animais pela centésima vez. Seu rosto, a parte não oculta pela máscara, parecia inexpressivo. Os rostos de pasteleiros chineses normalmente são inexpressivos. Certamente eles acreditam que as pessoas que compram pastéis estão mais interessadas em saber se o pastel é gostoso do que ficar olhando para um rosto chinês sorridente. Com máscaras os rostos chineses ficam ainda mais inexpressivos. A chinesa explicou que a Madame do Luluzinho apareceu lá antes de ir para a clínica do doutor Guilherme. Ela foi comprar uma guia para levar o animal ao veterinário. E neste contato infectou a dona do Bethoveen, O Magnífico e sua irmã. As duas estavam agora de quarentena.

            Ele exclamou perplexo:

“Que coisa!”

            Ele não tinha mais o que perguntar. Ele voltou para casa desconsolado. Emprestou o fusca para ir ao bairro Eliana, mais distante, onde havia outra loja de produtos para animais. Era a Bom Pastor. Em cuja frente havia a pintura de um alegre pastor alemão. Ele esperava que esta loja tivesse a Cefalexina 300 mg. Quando chegou, a área estava praticamente deserta. Como se tratava de bairro afastado do centro da cidade, com a maioria de casas de veranistas da capital que só apareciam na temporada, as ruas estavam desertas. Havia apenas um solitário homem com máscara, luvas de plástico e dois gatos nas mãos, de pé em frente da loja. Gatos que ele veio a saber em seguida tratarem-se de Tom e Jerry. Ele desceu do fusca, manteve-se a dois metros de distância e perguntou:

            “Que horas abre?”

            A pergunta fazia sentido porque muitas lojas tinham horário especial na pandemia. E também porque o homem não ficaria com dois gatos na calçada na frente da loja se ela não fosse abrir.

            Mas ele respondeu:

“Não vai abrir.”

Ele então perguntou quase distraído, mais por ironia:

“Foi a Madame do Luluzinho?”

O homem se assustou. Ele perguntou:

“Como o senhor sabe?”

Ele respondeu ainda sem acreditar que aquilo fosse verdade:

            “Ela infectou dois aviários lá no centro. Estive há duas horas por lá e os dois estão fechados. Um deles também é clínica veterinária.”

            O homem resmungou:

            “Uma imbecil prepotente e arrogante! Pensa que é dona do mundo. Está pouco se lixando para a sociedade e para os outros. Tem olhos apenas para o luluzinho e para próprio umbigo. Que não é lá grande coisa.”

            Ele ficou curioso:

“O senhor já viu o umbigo dela?”

“Claro. Na praia. Na temporada.”

            O homem apontou com a cabeça, movendo o queixo na direção de uma mansão que ocupava quase uma quadra inteira a duzentos metros, bem diante da praia. Era uma praia tão distante que costumava ficar deserta até na temporada.

            “Ela mora ali.”

            Bem, foi simples ele deduzir o que aconteceu. A Madame do Luluzinho foi primeiro no aviário perto de sua casa, o Bom Pastor, comprar a guia para o luluzinho. Não encontrando a guia que desejava, foi no centro na loja Beethoven, O Magnífico. Lá encontrou a guia que desejava e depois seguiu para a Arca de Noé, para a clínica do doutor Guilherme. No caminho foi infectando quem encontrava pela frente. E como estava infectada, fechou três aviários da cidade. Os três principais. Quanto ao homem na calçada, tratava-se de Jesualdo Maranhão, desembargador aposentado, setenta e cinco anos, do grupo de risco por ser velho, diabético e ter duas pontes de safena. Ele morava com a mulher numa bela casa no Eliana. Gostava do bairro porque era tranquilo. Quer dizer, deserto a maior parte do ano. A mulher dele o deixou ali e foi ao supermercado Brasão e ele a esperava voltar para buscá-lo com Tom e Jerry. Ele também achava que a loja fosse abrir mais tarde mas alguém passou por lá e contou toda história que ele contou para o homem do fusca.

            O homem disse alisando as cabeças dos dois gatinhos:

            “Hoje está sendo um dia difícil. Sei que não posso reclamar quanto à minha situação pessoal nesta pandemia, mas ando realmente triste. Fiquei sabendo que o Bom Pastor vai fechar. O Djailson, que é o dono, disse que não vai suportar três semanas de quarentena depois de todos estes meses sem movimento.”

            Ele respondeu:

“Realmente não está fácil para os pequenos empresários.”

Maranhão prosseguiu soturno:

“Foi aí que comprei o Tom e o Jerry.”

            O homem do fusca pensou em perguntar porque Maranhão colocou nome de rato famoso em um dos gatos anônimos, mas conseguiu segurar a curiosidade e fez apenas um movimento afirmativo com a cabeça.

            Maranhão devia aparecer com frequência por ali pois sabia detalhes da loja do Djailson:

            “Mesmo sendo atividade essencial e podendo ficar aberta, o faturamento caiu drasticamente, inviabilizando a manutenção da loja. A infecção causada no Djailson, mulher e filho pela Madame do Luluzinho foi o golpe de misericórdia. Não sei e ele certamente não sabe o que vai fazer. Eu tinha com este local vínculos afetivos. Vinha aqui quase toda semana só para ver os gatinhos disponíveis para adoção, acariciá-los, torcer para que conseguissem um bom lar. Com esta pandemia fiquei algumas semanas sem vir.”

Maranhão parecia prestes a se desmanchar em lágrimas.

Ele murmurou:

“Estou triste. Muito, muito triste.”

E para demonstrar que não se preocupava apenas com gatos, acrescentou:

“Toda semana recebo notícias de mortes de pessoas com alguma proximidade: uma vizinha da minha irmã, pais de amigos ou de colegas e conhecidos. E fico sabendo de muitos pequenos negócios que fecharam as portas. São sonhos frustrados, famílias em grande dificuldade, tristeza em cima de tristeza. E para piorar, um governo infame, horrível, nojento, asqueroso, que dá guarida e apoia grandes criminosos, anulando dívidas de sonegadores e ladrões do dinheiro público, lutando para perdoar grileiros assassinos, omitindo-se diante da pandemia, baixando centenas de normas contra a preservação ambiental.”

O homem do fusca apenas concordou em silêncio. Maranhão olhou as mãos do homem do fusca e disse, mudando de assunto:

“Você está com luvas de lã. Isto não resolve nada. Se você encontrar o vírus pela frente, vai se infectar. Ele penetra pelos poros deste tecido. Tem que ser luvas de plástico como estas.”

E mostrou as luvas dele que eram de plástico. O homem do fusca olhou as suas luvas. Agora não poderia fazer nada. Quando chegasse em casa, besuntaria as mãos com álcool gel. Era o máximo que poderia fazer.

Maranhão suspirou resignado:

“Emocionalmente falando estou muito triste.”

E acrescentou como se aquilo fosse o único consolo:

            “Ainda bem que hoje fiz pernil de cordeiro. Marinado por 24 horas, duas horas de forno. Parece que ficou bom. Acho que também vou tomar um vinho. São estas coisas que me fazem suportar esta pandemia. Eu passo dias e dias lendo e vendo filmes. A arte é o único antídoto contra a loucura. E o mundo está ficando louco.”

Um automóvel elegante de cor grafite e vidros fumê se aproximou, estacionou diante da loja e a porta se abriu. Maranhão saudou o homem do fusca:

“Espero que consiga resolver o seu problema que eu nem sei qual é.”

O homem do fusca disse:

“Cefalexina 300 mg.”

Maranhão não ouviu. Já tinha entrado no automóvel com Tom e Jerry. O homem do fusca voltou para o fusca e achou melhor esquecer a Cefalexina 300 mg por uns tempos e ir para casa, antes que uma patrulha de vírus o encontrasse dando sopa pela cidade e o infectasse. Quando chegou em casa, tirou o tênis branco, depois de estacionar o fusca na garagem. Em seguida deixou o chapéu marrom, as luvras pretas, a calça preta, a camisa cinza e o casaco marrom pendurados no varal para tomar sol, um sol fraco que foi esquentando por volta das onze horas. Entrou apenas de cueca em casa. Não havia mais ninguém além dele naquele horário. Ele besuntou as mãos de álcool gel e ficou olhando o ponteiro dos segundos do relógio da parede percorrer meio círculo. Segundo os especialistas era o suficiente para o vírus morrer, caso tivesse pegado carona em suas mãos. Ele encarou a cachorra enrolada no tapete olhando para ele e murmurou:

            “Você vai ficar sem Cefalexina 300 mg por duas ou três semanas.”

            Claro que a cachorra não entendeu. E se tivesse entendido não ia reclamar. Aquele remédio tinha gosto ruim. Ela tampouco entendeu quando ele concluiu:

            “Mas não reclame. Estamos vivos! Sem pernil marinado e um bom vinho, como o desembargador deve estar experimentando neste momento, mas vivos e tristes. Como ele.”

1 de August de 2020by edilsonpereira

EDILSON PEREIRA

Edilson Pereira é escritor, dramaturgo e jornalista.

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